Representantes da Âmbar Energia estiveram dezenas de vezes na sede da pasta, em Brasília. Em junho, MP aliviou caixa da Amazonas Energia – o que favoreceu negócios da Âmbar celebrados dias antes. Ministro Alexandre Silveira terá de explicar reunião com executivos
Deputados de oposição ao governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) protocolaram nesta terça-feira (9) ao menos dois requerimentos de informação ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira.
Os parlamentares querem explicações sobre encontros de Silveira e de outros dirigentes da pasta com executivos da empresa Âmbar Energia, do grupo J&F.
Um dos requerimentos de informação foi apresentado pelos deputados Marcel Van Hattem (Novo-SP) e Adriana Ventura (Novo-SP). O outro, pelo deputado Cabo Gilberto (PL-PB).
Na terça, reportagem do “Estadão” revelou que esses encontros antecederam a edição de uma medida provisória que beneficou a Âmbar em um contrato – e repassou esse custo aos consumidores de todo o país.
A GloboNews confirmou as reuniões citadas pela reportagem – incluindo uma entre Alexandre Silveira e o presidente da Âmbar Energia, Marcelo Zanatta, no dia 29 de maio.
O compromisso não foi incluído na agenda pública de Silveira. O executivo entrou no ministério pela entrada privativa, a mesma usada pelo ministro. O tema do encontro, assim como o agendamento, não foram divulgados.
Em nota (íntegra abaixo), o Ministério de Minas e Energia afirma que:
a intenção de venda dos ativos da Eletrobras comprados pela Âmbar era “de conhecimento público” desde julho de 2023;
a MP não foi discutida diretamente com a Âmbar ou qualquer outra empresa, e “os agentes privados, assim como qualquer cidadão, já tinham ciência do assunto” em razão de um relatório publicado em fevereiro deste ano;
os registros de entrada de executivos no ministério não significam, “necessariamente, que todas foram, de fato, recebidas pelas autoridades públicas”.
Também em nota (íntegra abaixo), a Âmbar Energia diz que:
“realizou um negócio privado, com uma empresa privada, após um acirrado processo competitivo” e as especulações são “descabidas”;
nunca tratou do tema com o Ministério de Minas e Energia;
todos os agentes do mercado elétrico tinham conhecimento de que se buscava uma solução para a “sustentabilidade econômica da Amazonas Energia” e, por isso, o risco de crédito da distribuidora era “temporário”.
Ministro Alexandre Silveira em imagem de arquivo
TON MOLINA/ESTADÃO CONTEÚDO
A medida provisória
Segundo a reportagem do “Estadão”, uma semana após o encontro fora da agenda, em 7 de junho, o ministério enviou à Casa Civil o texto de uma medida provisória que, na prática, favoreceu negócios de interesse da Âmbar.
A MP foi publicada efetivamente no dia 13 de junho. Como o g1 mostrou, o texto mudou regras para distribuidoras de energia com problemas financeiros.
Favoreceu, por exemplo, a Amazonas Energia, empresa cujo equilíbrio econômico-financeiro está comprometido. Com a MP, custos que a distribuidora deveria honrar foram transferidos para a Conta de Consumo de Combustíveis (CCC) – bancada com dinheiro dos consumidores de todo o país.
Ao g1, interlocutores do governo afirmam que a medida provisória deve gerar um custo de R$ 500 milhões por ano, pago pela CCC – ou seja, pelas contas de luz dos brasileiros.
Enquanto a MP tramitava internamente no governo, em 10 de junho, a Eletrobras emitiu nota ao mercado para informar que a Âmbar Energia – do grupo J&F, dos irmãos Wesley e Joesley Batista – havia comprado 12 usinas termelétricas.
Na operação, segundo o “Estadão”, a Âmbar assumiu também o risco de inadimplência dos contratos da Eletrobras com a Amazonas Energia envolvendo a operação das térmicas.
Com o socorro ao caixa da Amazonas Energia, na medida provisória publicada dias depois, na prática, o Ministério de Minas e Energia zerou o risco dessa compra.
A Comissão de Valores Mobiliários – autarquia vinculada ao Ministério da Fazenda que fiscaliza transações do tipo – deve investigar a negociação.
Reuniões frequentes no ministério
A GloboNews apurou que o presidente da Âmbar Energia, Marcelo Zanatta, esteve no Ministério de Minas e Energia pelo menos 20 vezes desde que Alexandre Silveira assumiu a pasta, em janeiro de 2023.
Também aparecem nos registros de entrada os nomes dos executivos Cristiano Souza – em pelo menos seis ocasiões – e de Fabio Tales Bindemann – pelo menos duas vezes.
Em vários desses encontros, os executivos iam ao MME na companhia de um advogado. Além do próprio ministro Silveira, os representantes foram recebidos pelo atual secretário-executivo, Arthur Cerqueira; pelo ex-ocupante do cargo, Efrain Cruz; e pelo secretário Nacional de Energia Elétrica, Gentil Nogueira.
O número de reuniões pode ser ainda maior, já que pelo menos uma das reuniões entre Silveira e Zanatta não foi inserida na agenda oficial: a do dia 29 de maio, uma semana antes da negociação das termelétricas e duas semanas antes da MP que beneficiou a Âmbar.
O que dizem os citados
Leia abaixo a íntegra dos posicionamentos divulgados:
Ministério de Minas e Energia
O Ministério de Minas e Energia (MME) esclarece que a intenção de venda dos ativos da Eletrobras era de conhecimento público, desde 07/07/2023, quando foi publicado um Comunicado de Mercado pela empresa.
Importante destacar ainda que, no âmbito do MME, o assunto MP nº 1232/2024 não foi discutido com a empresa citada ou qualquer outra do setor. Vale destacar que os agentes privados, assim como qualquer cidadão, já tinham plena ciência do assunto, por meio do relatório do Grupo de Trabalho independente, formado pelo MME e ANEEL, publicado e disponível desde fevereiro de 2024. Esse documento já sinalizava a necessidade das medidas implementadas pela MP para qualquer cenário (caducidade, intervenção ou troca de controle).
É importante esclarecer ainda que o registro da entrada de pessoas nas dependências deste ministério não significa, necessariamente, que todas foram, de fato, recebidas pelas autoridades públicas, seja por falta de um agendamento prévio, seja por conflito de agendas. Em outras palavras, o registro de entrada não confirma a realização de reunião ou audiência com representantes do MME.
Por fim, ressalta-se que as agendas públicas das autoridades do MME são lançadas no sistema e-Agendas, nos termos do Decreto nº 10.889/2021.
Âmbar Energia
A Âmbar realizou um negócio privado, com uma empresa privada, após um acirrado processo competitivo que envolveu propostas vinculantes de diversos grupos econômicos, dada a atratividade dos ativos ofertados.
São descabidas especulações a respeito da Medida Provisória 1.232 e o negócio realizado pela Âmbar. Não fazem sentido técnico e econômico, por diversos fatores. A Âmbar nunca tratou do tema com o Ministério de Minas e Energia.
A MP visa o reequilíbrio econômico e financeiro da distribuidora de energia do estado do Amazonas. Cerca de 30% da energia gerada pelas usinas incluídas na transação é contratada pela Amazonas Energia.
Todos os agentes do mercado elétrico tinham conhecimento, inclusive pela imprensa, de que uma solução para a sustentabilidade econômica da Amazonas Energia era urgente e iminente. O risco de crédito da distribuidora perante as usinas geradoras, portanto, era temporário.
Um grupo de trabalho formado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) e pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) concluiu, em relatório publicado em fevereiro de 2024, que havia três alternativas para solucionar a situação da Amazonas Energia: caducidade do contrato de concessão e re-licitação; intervenção na concessionária e re-licitação; flexibilização dos parâmetros regulatórios, para atrair potenciais novos interessados em assumir a concessão sem que a União tenha que arcar com seus passivos. Qualquer dessas soluções resolveria os riscos de crédito perante as usinas envolvidas na aquisição pela Âmbar.
O relatório também apontava para o agravamento da situação da Amazonas Energia justamente a partir de junho, já que as flexibilizações regulatórias oferecidas na concessão da empresa venciam em maio de 2024, piorando ainda mais a saúde financeira da empresa.
Todos esses fatos eram públicos quando a Âmbar apresentou sua oferta final pelos ativos.
Deputados de oposição ao governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) protocolaram nesta terça-feira (9) ao menos dois requerimentos de informação ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira.
Os parlamentares querem explicações sobre encontros de Silveira e de outros dirigentes da pasta com executivos da empresa Âmbar Energia, do grupo J&F.
Um dos requerimentos de informação foi apresentado pelos deputados Marcel Van Hattem (Novo-SP) e Adriana Ventura (Novo-SP). O outro, pelo deputado Cabo Gilberto (PL-PB).
Na terça, reportagem do “Estadão” revelou que esses encontros antecederam a edição de uma medida provisória que beneficou a Âmbar em um contrato – e repassou esse custo aos consumidores de todo o país.
A GloboNews confirmou as reuniões citadas pela reportagem – incluindo uma entre Alexandre Silveira e o presidente da Âmbar Energia, Marcelo Zanatta, no dia 29 de maio.
O compromisso não foi incluído na agenda pública de Silveira. O executivo entrou no ministério pela entrada privativa, a mesma usada pelo ministro. O tema do encontro, assim como o agendamento, não foram divulgados.
Em nota (íntegra abaixo), o Ministério de Minas e Energia afirma que:
a intenção de venda dos ativos da Eletrobras comprados pela Âmbar era “de conhecimento público” desde julho de 2023;
a MP não foi discutida diretamente com a Âmbar ou qualquer outra empresa, e “os agentes privados, assim como qualquer cidadão, já tinham ciência do assunto” em razão de um relatório publicado em fevereiro deste ano;
os registros de entrada de executivos no ministério não significam, “necessariamente, que todas foram, de fato, recebidas pelas autoridades públicas”.
Também em nota (íntegra abaixo), a Âmbar Energia diz que:
“realizou um negócio privado, com uma empresa privada, após um acirrado processo competitivo” e as especulações são “descabidas”;
nunca tratou do tema com o Ministério de Minas e Energia;
todos os agentes do mercado elétrico tinham conhecimento de que se buscava uma solução para a “sustentabilidade econômica da Amazonas Energia” e, por isso, o risco de crédito da distribuidora era “temporário”.
Ministro Alexandre Silveira em imagem de arquivo
TON MOLINA/ESTADÃO CONTEÚDO
A medida provisória
Segundo a reportagem do “Estadão”, uma semana após o encontro fora da agenda, em 7 de junho, o ministério enviou à Casa Civil o texto de uma medida provisória que, na prática, favoreceu negócios de interesse da Âmbar.
A MP foi publicada efetivamente no dia 13 de junho. Como o g1 mostrou, o texto mudou regras para distribuidoras de energia com problemas financeiros.
Favoreceu, por exemplo, a Amazonas Energia, empresa cujo equilíbrio econômico-financeiro está comprometido. Com a MP, custos que a distribuidora deveria honrar foram transferidos para a Conta de Consumo de Combustíveis (CCC) – bancada com dinheiro dos consumidores de todo o país.
Ao g1, interlocutores do governo afirmam que a medida provisória deve gerar um custo de R$ 500 milhões por ano, pago pela CCC – ou seja, pelas contas de luz dos brasileiros.
Enquanto a MP tramitava internamente no governo, em 10 de junho, a Eletrobras emitiu nota ao mercado para informar que a Âmbar Energia – do grupo J&F, dos irmãos Wesley e Joesley Batista – havia comprado 12 usinas termelétricas.
Na operação, segundo o “Estadão”, a Âmbar assumiu também o risco de inadimplência dos contratos da Eletrobras com a Amazonas Energia envolvendo a operação das térmicas.
Com o socorro ao caixa da Amazonas Energia, na medida provisória publicada dias depois, na prática, o Ministério de Minas e Energia zerou o risco dessa compra.
A Comissão de Valores Mobiliários – autarquia vinculada ao Ministério da Fazenda que fiscaliza transações do tipo – deve investigar a negociação.
Reuniões frequentes no ministério
A GloboNews apurou que o presidente da Âmbar Energia, Marcelo Zanatta, esteve no Ministério de Minas e Energia pelo menos 20 vezes desde que Alexandre Silveira assumiu a pasta, em janeiro de 2023.
Também aparecem nos registros de entrada os nomes dos executivos Cristiano Souza – em pelo menos seis ocasiões – e de Fabio Tales Bindemann – pelo menos duas vezes.
Em vários desses encontros, os executivos iam ao MME na companhia de um advogado. Além do próprio ministro Silveira, os representantes foram recebidos pelo atual secretário-executivo, Arthur Cerqueira; pelo ex-ocupante do cargo, Efrain Cruz; e pelo secretário Nacional de Energia Elétrica, Gentil Nogueira.
O número de reuniões pode ser ainda maior, já que pelo menos uma das reuniões entre Silveira e Zanatta não foi inserida na agenda oficial: a do dia 29 de maio, uma semana antes da negociação das termelétricas e duas semanas antes da MP que beneficiou a Âmbar.
O que dizem os citados
Leia abaixo a íntegra dos posicionamentos divulgados:
Ministério de Minas e Energia
O Ministério de Minas e Energia (MME) esclarece que a intenção de venda dos ativos da Eletrobras era de conhecimento público, desde 07/07/2023, quando foi publicado um Comunicado de Mercado pela empresa.
Importante destacar ainda que, no âmbito do MME, o assunto MP nº 1232/2024 não foi discutido com a empresa citada ou qualquer outra do setor. Vale destacar que os agentes privados, assim como qualquer cidadão, já tinham plena ciência do assunto, por meio do relatório do Grupo de Trabalho independente, formado pelo MME e ANEEL, publicado e disponível desde fevereiro de 2024. Esse documento já sinalizava a necessidade das medidas implementadas pela MP para qualquer cenário (caducidade, intervenção ou troca de controle).
É importante esclarecer ainda que o registro da entrada de pessoas nas dependências deste ministério não significa, necessariamente, que todas foram, de fato, recebidas pelas autoridades públicas, seja por falta de um agendamento prévio, seja por conflito de agendas. Em outras palavras, o registro de entrada não confirma a realização de reunião ou audiência com representantes do MME.
Por fim, ressalta-se que as agendas públicas das autoridades do MME são lançadas no sistema e-Agendas, nos termos do Decreto nº 10.889/2021.
Âmbar Energia
A Âmbar realizou um negócio privado, com uma empresa privada, após um acirrado processo competitivo que envolveu propostas vinculantes de diversos grupos econômicos, dada a atratividade dos ativos ofertados.
São descabidas especulações a respeito da Medida Provisória 1.232 e o negócio realizado pela Âmbar. Não fazem sentido técnico e econômico, por diversos fatores. A Âmbar nunca tratou do tema com o Ministério de Minas e Energia.
A MP visa o reequilíbrio econômico e financeiro da distribuidora de energia do estado do Amazonas. Cerca de 30% da energia gerada pelas usinas incluídas na transação é contratada pela Amazonas Energia.
Todos os agentes do mercado elétrico tinham conhecimento, inclusive pela imprensa, de que uma solução para a sustentabilidade econômica da Amazonas Energia era urgente e iminente. O risco de crédito da distribuidora perante as usinas geradoras, portanto, era temporário.
Um grupo de trabalho formado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) e pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) concluiu, em relatório publicado em fevereiro de 2024, que havia três alternativas para solucionar a situação da Amazonas Energia: caducidade do contrato de concessão e re-licitação; intervenção na concessionária e re-licitação; flexibilização dos parâmetros regulatórios, para atrair potenciais novos interessados em assumir a concessão sem que a União tenha que arcar com seus passivos. Qualquer dessas soluções resolveria os riscos de crédito perante as usinas envolvidas na aquisição pela Âmbar.
O relatório também apontava para o agravamento da situação da Amazonas Energia justamente a partir de junho, já que as flexibilizações regulatórias oferecidas na concessão da empresa venciam em maio de 2024, piorando ainda mais a saúde financeira da empresa.
Todos esses fatos eram públicos quando a Âmbar apresentou sua oferta final pelos ativos.
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